Os estudos direcionados à realidade amazônica são maximizados com o Pacto Amazônico, considerando-se que os temas do Tratado refletem as necessidades mais imediatas da região, a exigir tratamento jurídico especializado: direito ecológico; direito agrário; direito indígena; direito minerário; direito da navegação (fluvial); direito do comércio exterior; e, direito comunitário. Dai a denominação direito amazônico. Interpretar e aplicar o direito de acordo com o contexto regional.

quinta-feira, maio 01, 2008

Raposa Serra / do Sol - Montanari

Área indígena em faixa de fronteira não afeta soberania nacional, diz promotor

Shirleide Vasconcelos
Foto: Jader Souza

Isaías Montanari é promotor de Justiça e professor de Direito da UFRR

Na dissertação de mestrado pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), o professor do curso de Direito da UFRR (Universidade Federal de Roraima) e promotor de justiça Isaías Montanari, pesquisou sobre a demarcação de terras indígenas na faixa de fronteira sob o enfoque da defesa nacional.

O pesquisador constatou que a área indígena localizada em faixa de fronteira tem dupla afetação, ou seja, tanto é área indígena quanto é área de segurança nacional, mas a sua conclusão é a de que não há risco em relação à soberania nacional.

Montanari concluiu a pesquisa em 2005 e disse que fez um estudo de caso, não tratando de um local específico, porém afirmou que assim como outras áreas de reserva no Brasil, localizadas em área de fronteira, a Raposa Serra do Sol também é um exemplo do objeto de pesquisa.

Conforme Montanari, a terra indígena é de domínio da União. Os índios, segundo explicou, usufruem da terra podendo usá-la. “Eles [índios] não podem dispor da terra, ou seja, não podem explorar as riquezas minerais porque este tipo de riqueza é de propriedade da União”, disse.

Lembrou que para a terra ser considerada indígena é preciso de três pressupostos: direito originário dos índios, ocupação tradicional e ocupação permanente.

Na dissertação, Isaías Montanari explica que o trânsito das polícias e Forças Armadas na área indígena pode ocorrer sem nenhuma autorização da Funai (Fundação Nacional do Índio), porém alertou que qualquer destas forças têm que respeitar os locais onde os índios moram. “Para entrar numa maloca/casa é preciso ser convidado”, disse.

Na opinião dele, a terra yanomami, que também fica numa faixa de fronteira, também passou por uma série de discussões para a demarcação ocorrer. Naquela época dizia-se que a área poderia se tornar um país, o que até hoje não aconteceu. “Não existe isso porque só é um discurso, como estratégia para dificultar a demarcação da terra indígena”, afirmou.

Ressalta que todas as partes têm conhecimento dos direitos e no caso da Raposa Serra do Sol, o problema é a questão econômica. Ele questiona o fato de que no início da desintrusão não houve tantas indagações e agora, quando chega o momento da retirada de pessoas que detêm poder econômico e político, é que se criam os embaraços.

Ele discorda dos discursos relacionados à afetação da soberania nacional quando se fala da área indígena em faixa de fronteira. “A terra indígena é do Brasil e as Forças Armadas e policiais têm livre acesso”, destacou.

O professor de Direito fez questão de lembrar que a demarcação é um cumprimento de ordem legal do presidente da República e a oposição a isso é um ato ilegal e arbitrário, a não ser que haja decisão judicial diferente sobre o assunto.

Roraima tem sete áreas indígenas em faixa de fronteira

Conforme dados da Funai (Fundação Nacional do Índio), Roraima possui 32 áreas indígenas, sendo que destas, sete ficam em área de fronteira com outros países.

Segundo o coordenador substituto da Funai, Juvino Alba, as áreas indígenas nas fronteiras são: Yanomami e São Marcos, que fazem limites com a Venezuela; Jacamim, Bom Jesus, Wai-Wai e Manuá-Pium, que estão na fronteira com a Guiana e a Raposa Serra do Sol, que faz fronteira com os dois países.

Revista Veja trata Raposa Serra do Sol como “reserva de insensatez”

Em matéria publicada na edição desta semana, a revista Veja mostra como o Governo Federal conflagrou Roraima ao demarcar uma área “exagerada” para a reserva Raposa Serra do Sol. A reportagem conta a história da demarcação, desde os primeiros documentos, datados de 1917, relata como a reserva está ocupada atualmente e o que a produção local representa para a economia do Estado, assim como o fato da terra indígena ter engolido os cânions do rio Cotingo, apropriados para a construção de uma hidrelétrica considerada essencial pelo Governo do Estado.

A reportagem conta ainda como Roraima reagiu à demarcação da reserva e a história do presidente da Associação dos Rizicultores de Roraima, Paulo César Quartiero, que esteve à frente dos protestos. Cita ainda que os índios criam gado e que sua produção representa 6% do rebanho roraimense, que abastece os açougues locais.

“Roraima está conflagrada porque o governo cometeu um evidente exagero na demarcação das reservas indígenas do Estado. Há trinta anos, o então Território era ocupado majoritariamente por índios, que viviam em harmonia com os brancos. A boa convivência foi interrompida quando as demarcações começaram a se estender sobre partes expressivas de Roraima. Hoje, as 32 reservas indígenas que lá foram estabelecidas cobrem 46% do território do Estado. Sozinha, Raposa Serra do Sol responde por 7,5% da área do Estado. É uma superfície equivalente a doze cidades de São Paulo, mas lá moram apenas 19.000 índios”, diz o texto, que finaliza dizendo que ao demarcar a Raposa Serra do Sol em área continua de 1,7 milhão de hectares, o governo cometeu “um imenso equívoco”.

A revista Isto É desta semana também produziu reportagem tratando da questão indígena em Roraima.

(Jornal Folha de Boa Vista, de 28 de abril de 2008).