História
Zeno Veloso
Vi a fronteira Norte do Brasil.
Meu querido e saudoso Otávio Mendonça afirma que muitos consideram, Mendonça Furtado nosso maior estadista colonial.
Tenho viajado a todas as partes de nosso país, praticamente, fazendo palestras, abordando temas jurídicos, participando de congressos e seminários, em universidades, escolas da magistratura e instituições das mais diversas. Semana passada, conheci Boa Vista, no Estado de Roraima, a fronteira Norte do Brasil, em plena Amazônia. Cheguei a rodar alguns quilômetros nas estradas que levam, respectivamente, à Guiana Inglesa e à Venezuela. Senti uma emoção diferente, meu coração se encheu de orgulho e patriotismo. Falei para uma platéia de centenas de pessoas, a maioria de jovens. Encantei-me com o entusiasmo de todos, tirei fotos com dezenas deles, fiquei impressionado com a beleza das moças, uma delas, descendente de índios Wai-Wai, de origem caribenha. Outros professores estiveram presentes ao congresso jurídico roraimense, como Rodrigo da Cunha Pereira - presidente nacional do IBDFAM, Rodrigo Toscano de Brito - notável civilista e advogado paraibano e o ex-desembargador do TJ/RJ, Sylvio Capanema, que, no momento, é o presidente do Conselho Deliberativo do Flamengo, e ele me pediu que transmitisse as homenagens de seu clube à população paraense que integra a nação rubro-negra.
Há muito tenho falado na importância fundamental do Marquês de Pombal para a história do Brasil e, particularmente, da Amazônia. Ele foi uma espécie de primeiro ministro de D. José, rei de Portugal, pessoa pouco afeita aos negócios de Estado, às lides administrativas e políticas, de maneira que o Marquês mandou e desmandou em Portugal, até que o rei morreu e o ministro caiu em desgraça. Todavia, sua obra ficou.
Pombal foi figura destacada no processo de conquista do território brasileiro e da Amazônia. Não tenho medo de errar garantindo que, se não fosse ele, e sua visão de estadista, grande parte do que somos seria espanhol. Através de tratados, construções de fortes, e outras medidas estratégicas, nossa região foi sendo definitivamente ocupada, garantida, reconhecida.
Com a Provisão Régia de 14 de novembro de 1752, D. José I determinou ao governador do Grão-Pará, Francisco Xavier de Mendonça Furtado, que fosse construído um forte às margens do alto rio Branco. Era uma reação a grupos invasores estrangeiros que tinham sido expulsos da foz do Amazonas, por volta de 1616.
Esse Mendonça Furtado foi mandado para cá por seu irmão, o poderoso Pombal. É personagem essencial e importantíssima da história de nossa região, e é pessoa quase desconhecida, que nunca mereceu as honras e homenagens devidas a ele. Meu saudoso e querido Otávio Mendonça afirma que muitos o consideram nosso maior estadista colonial, tendo marcado de grandeza tudo quanto fez, e foi, de fato, o primeiro plantador do desenvolvimento amazônico. O ciclo pombalino, repleto de grandes momentos e de muitos desencontros, cheio, como quase tudo na vida, de vitórias e derrotas, teve em Mendonça Furtado um de seus maiores expoentes. O ex-governador do Pará não passou por aqui em brancas nuvens, muito, ao contrário. Precisamos resgatar e enaltecer a sua memória. Temos uma grande dívida com ele.
Voltando a Roraima, conhecida como terra de Macunaíma (e não Macunaíma),
reencontrei meu amigo Alcir Gursen de Miranda, que é juiz de Direito, está na vez para ser nomeado desembargador, um dos maiores especialistas brasileiros em Direito Agrário e intelectual brilhante. É reconhecido como um dos maiores historiadores daquela região, mas nasceu no Pará, sua origem é marajoara, da cidade de Anajás. Agora mesmo, estou lendo seu livro: "Historiando a terra de Macunaíma - a questão indígena".
O problema indígena, naquele Estado, gera uma grave instabilidade, um conflito interminável, causado por alguns excessos na demarcação de terras que são conferidas às tribos. Só a área indígena denominada Raposa/Serra do Sol, na região nordeste de Roraima, envolvendo os municípios de Normandia e Uiramutã, tem 1.678.800 hectares - um mundo! E nessa demarcação foram despejadas centenas de pessoas, inúmeras famílias que lá habitavam e produziam, muitas delas com lotes de terras conferidos pelo próprio Incra.
Lembrei-me de meu discurso de formatura, dezenas de anos passados, e com o mesmo entusiasmo, porém, com a voz bem mais cansada, consigo gritar: "Alô, Alô, Roraima, aquele abraço!"
Zeno Veloso é jurista