Os estudos direcionados à realidade amazônica são maximizados com o Pacto Amazônico, considerando-se que os temas do Tratado refletem as necessidades mais imediatas da região, a exigir tratamento jurídico especializado: direito ecológico; direito agrário; direito indígena; direito minerário; direito da navegação (fluvial); direito do comércio exterior; e, direito comunitário. Dai a denominação direito amazônico. Interpretar e aplicar o direito de acordo com o contexto regional.

terça-feira, agosto 26, 2008

Indígena

SUPREMO - Julgamento da Raposa será em dois dias.

(LOIDE GOMES)

O julgamento da legalidade da demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol no Supremo Tribunal Federal (STF) vai durar dois dias. Os 11 ministros se reúnem no plenário às 9h de amanhã e voltam a se juntar na quinta-feira, a partir das 14h, para dar continuidade ao julgamento.

O início dos trabalhos pela manhã é uma excepcionalidade a que o Supremo só se permite em julgamentos de grandes repercussões, como é o caso da análise jurídica sobre a reserva localizada no norte de Roraima, em uma área de 1,7 milhão de hectares. Normalmente, as sessões acontecem à tarde.

Na pauta, a ação popular 3388, protocolada pelo senador Augusto Botelho (PT) cinco dias após a homologação da demarcação pelo presidente Luís Inácio Lula da Silva (PT), em 15 de abril de 2005. O principal argumento aponta para a falsidade do laudo antropológico que resultou na demarcação e homologação da reserva em faixa contínua e não em ilhas.

A ação tem como assistente o senador Mozarildo Cavalcanti (PTB). Ele apresentou o pedido ao STF um ano após o ingresso da petição inicial do senador Botelho. Também figuram como autores o Estado de Roraima e os arrozeiros.

O Estado tem diversas ações no Supremo questionando a legalidade da demarcação da reserva, mas se juntou aos senadores roraimenses, como litisconsórcio necessário da ação popular, no dia 8 de maio deste ano, um mês após ter conseguido por decisão unânime dos ministros do STF a suspensão da Operação Upatakon 3, para retirada dos não-índios da região.

No dia 13 de maio foi a vez dos ocupantes não-índios ingressarem com o mesmo pedido, liderados pelo pecuarista Lawrence Manly Harte, do Município de Normandia.

Do outro lado, figuram como réus a União, a Funai (Fundação Nacional do Índio) e as comunidades indígenas de Socó e Barro – como os índios ligados ao Conselho Indígena de Roraima (CIR) preferem chamar a Vila Surumu. O pedido para ingressar no pólo passivo da ação também ocorreu após a suspensão da ação de retirada dos “brancos”.

Para o procurador-geral de Roraima em exercício, Edival Braga, a ação cautelar que cessou a operação foi um marco na disputa jurídica, pois foi a partir dela – e do confronto no Surumu entre os meses de março e abril – que o Supremo elegeu o julgamento da demarcação como prioridade. Além disso, decidiu que julgaria em breve o mérito da questão, para pôr fim à tramitação das 33 ações que hoje estão nas mãos do ministro Carlos Ayres Britto, relator do caso.

A afirmação do procurador se confirma pelo tamanho da peça processual. Antes da explosão do conflito, em março, e da ação cautelar patrocinada pelo Governo do Estado, o processo tinha dois volumes. Hoje são 40, com quase 300 páginas. E os pedidos não param de chegar. O mais recente foi protocolado na sexta-feira. Nele, os arrozeiros pedem para fazer a defesa oral de sua posição.

Também quer falar durante o julgamento a advogada Joênia Bastos de Carvalho. O pedido, assinado pelos índios do Socó, foi apresentado no último dia 13. Antes disso, no dia 7, foi a vez dos procuradores do Estado de Roraima solicitarem a sustentação oral.

Caso o STF defira os pedidos, o debate promete. Da etnia wapixana, Joênia é a primeira advogada índia a falar durante um julgamento na mais alta Corte do país. Seus argumentos deverão ser rebatidos por dois juristas de peso. Em nome do Estado de Roraima, atua o ex-ministro do STF Francisco Rezek. Dos arrozeiros, o também ex-ministro do Supremo Ilmar Galvão.

Quanto à União, a Procuradoria-Geral da República manifestou parecer pela improcedência da revisão do processo demarcatório.

Veja como será a ordem de votação

O julgamento deverá ter o voto de dez ministros do STF. O presidente, Gilmar Mendes, só deverá se manifestar em caso de empate, para dar o voto de minerva.

Na abertura da sessão, o relator do caso, Carlos Ayres Britto, fará a leitura de seu voto. Depois, começa a votação, provavelmente seguindo o critério da antiguidade, como prevê o regimento do tribunal, a começar pelo ministro mais novo, ou seja, o último que ingressou na Corte.

Se for mantido este critério, depois de Ayres Brito votam os ministros Menezes Direito, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Eros Grau, Joaquim Barbosa, Cezar Peluso, Ellen Gracie, Marco Aurélio Melo e Celso de Mello.

Acredito que o Supremo deve fazer alguma alteração, diz autor da ação

O senador Augusto Botelho (PT) está confiante que o Supremo Tribunal Federal (STF) vai alterar as regras do jogo para demarcação de terras indígenas no Brasil. Na sua avaliação, porém, os ministros não manterão a homologação contínua, como defende o CIR, tampouco determinarão a delimitação da reserva em ilhas, como peticiona.

“Quando o Governo Federal demarca uma reserva sem ouvir o Estado, está quebrando o pacto federativo, então eu acho que o Supremo vai decidir no sentido de manter o pacto federativo”, disse.

Botelho comenta ainda que o Supremo “não pode” autorizar demarcações com base em um único laudo antropológico, “que é falso”. “Os ministros não vão compactuar com uma coisa dessas”.

Na opinião dele, as demarcações provocaram “injustiças” pois muitas delas não respeitaram o direito de defesa e o amplo contraditório dos desintrusados.

“Essa garantia só veio posteriormente, quando Nelson Jobim foi ministro da Justiça. Com isso, formou-se uma legião de pessoas injustiçadas. Espero que isso mude. Se não for neste governo, será nos próximos. Sou um homem de muita esperança”, frisou.

(Fonte: Jornal Folha de Boa Vista, de 26 de agosto de 2008).