Os estudos direcionados à realidade amazônica são maximizados com o Pacto Amazônico, considerando-se que os temas do Tratado refletem as necessidades mais imediatas da região, a exigir tratamento jurídico especializado: direito ecológico; direito agrário; direito indígena; direito minerário; direito da navegação (fluvial); direito do comércio exterior; e, direito comunitário. Dai a denominação direito amazônico. Interpretar e aplicar o direito de acordo com o contexto regional.

quinta-feira, agosto 21, 2008

Indígena

VISITA DA ONU - Relator diz que não faz pressão ao STF.

(LOIDE GOMES)

Em visita à reserva Raposa Serra do Sol, o relator especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para os Direitos e Liberdade dos Povos Indígenas, James Anaya, disse ontem que não pretende com sua vinda ao Brasil influenciar a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que no dia 27 julga a legalidade da demarcação da terra indígena.

“Espero que os ministros dêem a sua sentença baseados em critérios políticos e não com base em critérios alheios ao processo judicial”, afirmou. Indagado sobre o que a ONU fará caso a decisão do Supremo seja para rever a demarcação da reserva, evitou comentários: “Não vou opinar sobre o que vai fazer o Supremo Tribunal”.

Ele elogiou a Constituição Federal no que diz respeito à proteção aos povos indígenas e disse que a carta brasileira pode servir de exemplo para outros países. “A Constituição brasileira é avançada em relação aos direitos humanos e aos direitos dos povos indígenas e serve de exemplo para outros países”, disse.

Apesar disso, ponderou que “nenhum país é perfeito”. “A vinda do relator da ONU faz parte de uma cooperação entre os países para melhorar a situação dos direitos humanos”.

O relator chegou a Roraima na madrugada de ontem, acompanhado por assessores e por Tarien Lesser, do Alto Comissariado para os Direitos Humanos da ONU, em Genebra.

Índio do Estado americano do Arizona, Anaya foi nomeado relator especial da ONU em março deste ano e faz sua primeira visita oficial ao Brasil desde o dia 12. O objetivo é conhecer a situação dos povos indígenas do país e elaborar um relatório que será apresentado em dezembro. A missão já passou por Brasília, Mato Grosso do Sul e pelo Amazonas. Depois de Roraima, segue para o Mato Grosso, antes de encerrar no dia 25.

Apesar de já ter cumprido mais da metade da missão oficial, ele evitou fazer uma análise sobre possível violação de direitos humanos contra os índios no país.

“Estou avaliando a situação. Não posso tomar conclusões antes de terminarmos a visita”, disse, lembrando que apresentará informe no dia 25, em entrevista coletiva, para apresentar suas primeiras impressos da situação dos povos indígenas brasileiros.

James Anaya visita reserva yanomami

A visita que o relator da ONU, James Anaya, faz a Roraima é de três dias. Hoje ele vai conhecer a reserva yanomami e no retorno para Boa Vista, às 17h30, reúne-se com lideranças indígenas de todo o Estado, na sede da Funai (Fundação Nacional do Índio).

Amanhã, o relator vai até a aldeia Malacacheta, no Município de Cantá, ver como vivem os wapixana. Ontem ele sobrevoou as aldeias Jawari, Homologação, Contão e as fazendas de arroz localizadas dentro da reserva antes de pousar no Distrito de Surumu, para se reunir com os índios e administrador da Funai, Gonçalo Teixeira, no coração dos conflitos envolvendo a posse da terra entre índios e não-índios, a 190 quilômetros de Boa Vista.

Anaya desembarcou no Surumu perto do meio-dia, em avião Caravan, alugado pela Funai, escoltado por 48 homens da Polícia Federal e da Força Nacional de Segurança. Ele foi recebido por cerca de 700 índios, todos ligados ao Conselho Indígena de Roraima (CIR), organização que lidera o movimento a favor da retirada dos não-índios da região.

A reunião, fechada para os jornalistas, foi no Centro Indígena de Formação e Cultura Raposa Serra do Sol (antiga Missão Surumu), incendiado em 2005. O local, que fica na parte não-índia da vila, foi parcialmente recuperado e hoje abriga 60 alunos indígenas em diversos cursos. Anaya visitou as instalações, inclusive os escombros de um alojamento e da igreja que ainda não foram reconstruídos.

Na reunião, as lideranças do CIR fizeram um relato detalhado da violência sofrida pelos indígenas nos últimos trinta anos, usando computadores e data-show para apresentar as informações.

CAXIRI NA CUIA – Antes do encontro, o relator da ONU foi saudado por crianças e jovens Macuxi que cantaram e dançaram para dar boas-vindas ao visitante importante. Em espanhol – traduzido para o português por um intérprete – ele agradeceu a recepção calorosa e disse que estava ali para ouvir o que os índios tinham a dizer sobre sua situação.

A comitiva da ONU, que contou ainda com o representante da organização no Brasil, o português Manuel Romão, almoçou com os índios. James Anaya experimentou damorida, um ensopado de carne muito apimentado, e tomou caxiri na cuia, bebida alcoólica feita com a fermentação da mandioca, especialidades da culinária Macuxi.

Tuxaua critica visita de representante da ONU

Os indígenas favoráveis à revisão da demarcação da Raposa Serra do Sol criticaram a visita do relator da ONU. “Esta é uma visita unilateral. Nós não fomos convidados para participar desse encontro”, disse o tuxaua José Brazão de Braga, membro da Sodiurr (Sociedade de Defesa dos Índios Unidos de Roraima).

Os moradores da vila também ficaram insatisfeitos. Na avaliação da funcionária pública Gemilza dos Santos Ambrosio, 25 anos, descendente da tribo Macuxi, a ausência de convite para os índios do “outro lado”, seria uma demonstração de que a visita do relator especial da ONU teria o objetivo de coletar informações para reforçar a “posição já existente de manter a demarcação contínua”.

Anaya destacou, porém, que vai tentar ouvir todos os lados envolvidos na polêmica. “Gostaria de visitar a todos que estejam interessados na situação dos direitos humanos. Há o problema do tempo, mas vamos sim tentar fazer isso”, disse.

(Fonte: Jornal Folha de Boa Vista, de 21 de agosto de 2008).