Os estudos direcionados à realidade amazônica são maximizados com o Pacto Amazônico, considerando-se que os temas do Tratado refletem as necessidades mais imediatas da região, a exigir tratamento jurídico especializado: direito ecológico; direito agrário; direito indígena; direito minerário; direito da navegação (fluvial); direito do comércio exterior; e, direito comunitário. Dai a denominação direito amazônico. Interpretar e aplicar o direito de acordo com o contexto regional.

segunda-feira, dezembro 22, 2008

Indígena - Raposa/Serra do Sol-Direitos Humanos


A Raposa / Serra do Sol e os Direitos Humanos


Fonte: a A A A

Gursen De Miranda *

A Declaração Universal de Direitos Humanos da ONU, de 1948, seguindo a linha da Carta das Nações Unidas, de 1945, teve como desdobramento dois Pactos Internacionais, em 1966: Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, e, Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Se é certo que a Declaração da ONU tem apenas valor moral e político, os Pactos possuem valor jurídico com força obrigatória de cumprimento nos ordenamentos jurídicos dos Estados pactuantes.

A separação em dois Pactos de Direitos Humanos reflete o contexto político internacional da chamada “guerra fria” entre os blocos liderados pelos Estados Unidos de um lado e de outro a União Soviética. A divisão não é jurídica; é meramente ideológica, de cunho político. Ademais, não implica essa divisão em qualquer hierarquia, pois não há hierarquia entre os Pactos. A Declaração e Programa de Ação de Viena, de 1993, a teor de norma expressa em seu item 5, define que “todos os direitos humanos são universais, indivisíveis e interrelacionados”, acrescentando a referida Declaração que “a comunidade internacional deve tratar os direitos humanos de forma global, justa e eqüitativa, em pé de igualdade e com a mesma ênfase”.

Nesse sentido o Estado deve proteger e promover todos os direitos humanos e liberdades fundamentais, de modo a garantir a realização plena desses direitos.

Nos Pactos, portanto, acordam que os direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais possuem igual valor. Valores da liberdade (fruto do liberalismo – Estado Liberal) e valores da igualdade (fruto do socialismo – Estado Social), refletindo os dois momentos iniciais de sedimentação dos direitos humanos (alguns autores chamam geração, outros dimensão). Se em um primeiro momento os direitos individuais (v.g. direito de propriedade) prevaleceram, atualmente os direitos coletivos e interesses difusos (v.g. proteção de grupos humanos e ambiente) estão em um mesmo patamar jurídico, sem hierarquia.

No caso da demarcação da Área Indígena Raposa / Serra do Sol a solução jurídica poderia ser encontrada observando-se, exatamente, a igualdade de valores dos direitos humanos.

Enquadrado no amplo aspecto do direito dos povos, em nível internacional, o direito dos índios esta garantido como direito fundamental pela Constituição Federal, de 1988 (arts. 231 e 232). São garantidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam.

Na mesma linha dos direitos e garantias fundamentais, a Constituição Federal garante o direito de propriedade (art. 5º, inc. XXII). A propriedade, todavia, somente merecerá garantia se atender a sua função social (art. 5º, inc. XXIII). Por sua vez, a plenitude da propriedade agrária está na produção de alimentos, no âmbito do chamado direito alimentário, na forma do artigo 11, do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Ora, sem alimento a pessoa humana não sobrevive. O alimento é indispensável ao ser humano da mesma forma que o ar para respirar. Com efeito, a terra que produz alimento é terra que deve ser garantida pelo Estado, garantia que a produção de alimento não seja interrompida nem cessada, para que não falte alimento ao povo, tanto índios quanto não-índios. Não importa que a terra não tenha título de propriedade; o que se garante é a produção de alimento dessa terra, no exercício do trabalho na atividade agrária.

Juridicamente, portanto, o direito dos índios, em nível de direito internacional e de direito nacional, tem igual valor ao de terra que produz alimento.

* Jurista