Os estudos direcionados à realidade amazônica são maximizados com o Pacto Amazônico, considerando-se que os temas do Tratado refletem as necessidades mais imediatas da região, a exigir tratamento jurídico especializado: direito ecológico; direito agrário; direito indígena; direito minerário; direito da navegação (fluvial); direito do comércio exterior; e, direito comunitário. Dai a denominação direito amazônico. Interpretar e aplicar o direito de acordo com o contexto regional.

sexta-feira, março 20, 2009

Indígena - Raposa/Serra do Sol


Não-índios lamentam decisão do STF



Foto: Charles Bispo

Com a decisão, não-índios lamentaram e choraram, enquanto índios comemoravam com a dança Parixara

ANDREZZA TRAJANO

A constitucionalidade da demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol em área contínua garantida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) levou às lágrimas os habitantes não-índios, que terão que deixar a região.

Ontem, o último ministro que faltava voltar sobre a questão, o presidente da Suprema Corte, Gilmar Mendes, foi favorável à manutenção da área de 1,7 milhão de hectares, exclusiva aos indígenas. Entretanto, ele também acompanhou o voto do ministro Menezes Direito quanto às condicionalidades que devem ser observadas para preservação do meio ambiente e garantia da soberania nacional.

Muito emocionada, a comerciante Luiza Pereira, 69, não conteve as lágrimas ao saber da decisão. Ela vive na Raposa Serra do Sol há mais de 60 anos. Lá casou, criou os filhos, ficou viúva e hoje cria os netos. Toda a sua história vai parar em uma mala e na estrada.

“Amanhã [hoje] mesmo já vou começar a fazer minhas malas e desmontar minha casa. Mas só saio daqui quando me indenizarem. Estão tirando de mim o meu chão, as minhas referências. Como começar de novo já nessa idade?”, indagou emocionada.

Cerca de 20 habitantes não-índios também choraram ao saber que terão que sair da reserva. Eles acompanharam o julgamento do STF por meio de uma TV por assinatura. Ao final se abraçaram, choraram, rezaram e reafirmaram que só deixarão suas casas quando forem reassentados e receberem indenização prévia e de justo valor.

A reportagem tentou ouvir Renato Quartiero, filho do rizicultor Paulo César Quartiero. Segundo funcionários da fazenda Depósito, onde está comandando a colheita de mais de 900 hectares de arroz, ele não possuía condições emocionais de conceder entrevista. Estava abalado com a decisão do STF.

DESINTRUSÃO - Ficou a cargo do relator do processo, ministro Ayres Britto, e dos ministros do Tribunal Regional Federal (TRF) definir quando a Operação Upatakon 3, que consiste na retirada de habitantes não-índios da reserva, será executada. Os ministros, além de manterem a constitucionalidade da demarcação por um placar de 10 a um, cassaram a liminar que em abril do ano passado suspendeu a desintrusão.

Na Raposa Serra do Sol vivem cerca de 18 mil índios das etnias Macuxi, Taurepang, Patamona, Wapichana e Ingaricó e 200 famílias de não-índios. Seis grandes produtores de arroz produzem na área.

CIR comemora decisão do STF

Enquanto habitantes não-índios lamentavam porque terão que deixar suas casas situadas na terra indígena Raposa Serra do Sol, índios ligados ao Conselho Indígena de Roraima comemoravam a palavra final do STF.

Os integrantes do CIR, que até o voto do presidente do Supremo, ministro Gilmar Mendes, estavam dormindo em redes ou sentados conversando na frente de suas casas aguardando a decisão, retomaram as comemorações iniciadas na quarta-feira, quando o julgamento da legalidade da demarcação foi retomado.

Eles vestiram roupas tradicionais e dançaram o Parixara, sob o olhar atento dos agentes federais. Um deles carregava uma bandeira com o mapa da Raposa Serra do Sol. Eles ainda mataram um boi e fizeram churrasco. Mas a comemoração mesmo, segundo eles, deve ocorrer no dia 19 de abril, Dia do Índio.

Os indígenas disseram ainda que agora vão sentar para analisar as propostas de retirada dos habitantes não-índios que em breve deve ser apresentada pelo ministro Ayres Britto e os integrantes do TRF.

“Vamos conversar com as lideranças para ver essa situação e logo vamos ter nossa posição, pois quem vai decidir é a maioria dos tuxauas da Raposa Serra do Sol. Vamos acatar algumas coisas e dar uma decisão depois para eles [arrozeiros]. Seja qual for nossa manifestação, ela será pacífica”, disse aos jornalistas Martinho Macuxi, coordenador do Movimento Raposa Serra do Sol, ao ser questionando se os índios vão invadir as fazendas de arroz ou aguardar o processo de retirada dos não-índios que será feito pela Polícia Federal em conjunto com outros órgãos.

(Fonte: Jornal Folha de Boa Vista, de 20 de março de 2009).