Os estudos direcionados à realidade amazônica são maximizados com o Pacto Amazônico, considerando-se que os temas do Tratado refletem as necessidades mais imediatas da região, a exigir tratamento jurídico especializado: direito ecológico; direito agrário; direito indígena; direito minerário; direito da navegação (fluvial); direito do comércio exterior; e, direito comunitário. Dai a denominação direito amazônico. Interpretar e aplicar o direito de acordo com o contexto regional.

quinta-feira, junho 25, 2009

Científico


O pensar o Direito ... Amazônico



Gursen De Miranda *

A reforma do ensino brasileiro no início da década de setenta do século passado, certamente, causou verdadeiro corte epistemológico na estruturação do conhecimento jurídico. As ciências jurídico-sociais passaram a dois campos distintos nas ciências sociais. Perderam todos. A compreensão sociológica ficou sem o balizamento normativo. A compreensão jurídica tornou-se nanica sem o elemento social.

As lições de Montesquieu sobre a geografia da lei tornaram-se vazias e incompreensíveis. A história, com a Escola Histórica do Direito, passou, literalmente, para história — e o SAVIGNY ficou apenas com a metodologia do Direito. A geografia e a história passaram a ser um nada no Direito ... tudo é norma. O Direito é o Estado; o Estado é o Direito. A tirania da democracia fez história.

O Direito ficou literalmente perdido no tempo e no espaço, impondo-se de forma homogênea, com pretensão universalista. Surgem os chamados “novos direitos”, mas, em verdade, nova roupagem chamada direitos humanos ao que LOCKE e outros há mais de dois séculos chamaram de direitos naturais. Teria sido a forma de imposição dos “donos do mundo”, que teve como marco os Pactos Internacionais, de 1966, apesar do pouco caso com os direitos econômicos, sociais e culturais (estes seriam aplicados apenas na medida do possível). O certo é que, com essa concepção ideológica, foram assimilados e incorporados pelas Constituições dos Estados como direitos fundamentais, todavia, a possibilidade física e jurídica mantinha-se, pois seriam apenas normas programáticas.

Não obstante essa forma de pensar o Direito, em diversos lugares evidenciam-se dessemelhantes formas de expressão social e cultural, criando-se diferentes direitos. O universalismo jurídico, no vácuo da globalização econômica e cultural depara-se com a realidade regional e o fortalecimento do regionalismo, quando avulta o paradoxo da globalização.

Na América-Amazônica torna-se realidade um Direito Amazônico. Direito regionalizado, multidisciplinar e transnacional, a contemplar matéria peculiar à realidade da região, delimitadas por um tratado internacional regional, o Pacto Amazônico, de 1978. Não obstante, se há essa peculiaridade no âmbito da floresta e/ou da bacia amazônica, evidencia-se o pluralismo de pessoas humanas na pluralidade de Estado, além do reconhecimento de Estado com pluralismo de nações (Bolívia e Equador).

A Amazônia Brasileira não é diferente nessa forma de pensar, considerando-se o mosaico social e cultural da região. Abstraindo o índio e o negro, amparados constitucionalmente, o principal elemento humano da Amazônia – o caboco – não tem merecido nem amparo legal, desde seu reconhecimento oficial por meio da Lei de D. José I, nos idos de 1755, quando a Amazônia era chamada de Grão-Pará.

Evidencia, assim, a necessidade de Direito de acordo com a concretude social do povo, na linha de pensar de um CASTANHEIRA NEVES; a lembrar o “direito fantasma” de IHERING, referindo-se a dissociação entre o Direito no papel e o real papel do Direito na sociedade, com seu modo de ser, de pensar, de viver ... com valores próprios.

Tudo a exigir um (re) pensar o federalismo brasileiro, em quatro dimensões sem hierarquização, de União, Região, Estado Federal e Município, como está sinalizado, pelo teor do artigo 45, da Constituição da República, destacadamente com os Tribunais regionais (TRT – art. 111; TRE – art. 120; TRF – art. 107).

Aliás, no contexto amazônico, destaca-se não apenas uma diversidade fundiária, (terras públicas, terras devolutas, terras privadas, terras quilombolas, terras indígenas, etc.), mas, principalmente, um pluralismo sociocultural na configuração do espaço fundiário (caboco tradicional, seringueiro, castanheiro, pescador artesanal, índio, negro, etc.)

Todos com realidade própria a exigir um Direito – o Direito Amazônico.

* Jurista