Os estudos direcionados à realidade amazônica são maximizados com o Pacto Amazônico, considerando-se que os temas do Tratado refletem as necessidades mais imediatas da região, a exigir tratamento jurídico especializado: direito ecológico; direito agrário; direito indígena; direito minerário; direito da navegação (fluvial); direito do comércio exterior; e, direito comunitário. Dai a denominação direito amazônico. Interpretar e aplicar o direito de acordo com o contexto regional.

terça-feira, agosto 25, 2009

Cultural

Diversidade cultural e Amazônia - I

Gursen De Miranda *

A Amazônia possui diversos espaços, com diversidade cultural, diversidade de pessoas, em diversas atividades típicas da região, constituindo-se em verdadeiro “laboratório” sobre diversidade nas suas diversas dimensões. Todavia, a compreensão desse fenômeno da sociedade amazônida se compagina com a orientação do direito internacional?

Diversos espaços e diversos tempos de diversas pessoas e grupos na expressão cultural

A compreensão de diversidade cultural, no âmbito do direito internacional, seria a multiplicidade de formas em que se expressam as culturas dos grupos e sociedades. Estas expressões se transmitem dentro e entre os grupos e as sociedades. É a orientação normativa expressa no artigo 4º nº 1, da Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade de Expressões Culturais (CPPDEC). A Convenção foi assinada por ocasião da Conferência Geral da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, em sua 33ª reunião, celebrada em Paris de 3 a 21 de outubro de 2005. Dos 154 países representados apenas os Estados Unidos da América do Norte e Israel votaram contra (abstiveram-se Austrália, Nicarágua, Honduras e Libéria). A Convenção entrou em vigor no dia 18 de março de 2007.

Se os homens não fossem iguais, lembra HANAH ARENDT (A condição humana, p. 188), seriam eles incapazes de compreenderem-se entre si e aos seus ancestrais, ou de fazer planos para o futuro e prever as necessidades de gerações vindouras. Mas se não fossem diferentes, se cada ser humano não diferisse de todos os que existiram, existem ou virão a existir, os homens não precisariam do discurso ou da ação para se fazerem entender. Com simples sinais e sons poderiam comunicar suas necessidades imediatas e idênticas, à semelhança do que ocorre com os animais.

Certamente, a diversidade cultural não se manifesta apenas nas diversas formas em que se expressa, enriquece e transmite o patrimônio cultural da humanidade mediante a variedade de expressões culturais, mas, também, por meio de distintos modos de criação artística, produção, difusão, distribuição e desfrute das expressões culturais, quaisquer que sejam os meios e tecnologias utilizados.

A identidade cultural de um povo, com sua dinâmica, renova-se e enriquece-se em contato com as tradições e valores dos demais, conforme firmado por meio da Declaração do México sobre as Políticas Culturais (DMPC: n° 4), durante a Conferência Mundial sobre as Políticas Culturais (MONDIACULT), realizada no México (DF), no período de 26 de julho a 6 de agosto de 1982. Como característica essencial da humanidade (CPPDC: Preâmbulo), a diversidade cultural seria o reflexo das diversas identidades culturais. É essa pluralidade de identidades culturais que define a diversidade cultural. Em verdade, identidade cultural e diversidade cultural são indissociavéis (DMPC: n° 5).

Se é certo que a diversidade cultural se fortalece mediante a livre circulação das idéias e se nutre dos intercâmbios e das interações constantes entre as culturas, não é menos certo, no entanto, que o respeito mútuo e a tolerância entre as identidades culturais, num ambiente democrático e de justiça social é inafastável (CPPDEC: Preâmbulo).

O intercâmbio entre as diversas identidades culturais deve começar pela troca de informações sobre as diferentes culturas envolvidas, visando estimular a cooperação intergrupal assente em gradual reconhecimento da diversidade e em modificação das percepções interpessoais, no sentido de uma convivência no diálogo transformador que proporciona ação conjunta dos interlocutores, assentada no princípio da igualdade e na diversidade, sem atribuir supremacia a qualquer cultura (Conforme o “modelo hermenêutico-interpretativo e o “modelo crítico-sociopolítico” exposto por ANDRÉ, João Maria (in Interculturalidade, comunicação e educação para a diferença, p. 274)).

Todavia, o sucesso dos intercambios e das interações não será legítimo se os direitos fundamentais forem desprezados, no mesmo sentido se os direitos humanos não forem atendidos em determinado grupo social. As dificuldade econômicas e a desigualdade entre as nações são realidades presentes e crescentes, daí a UNESCO (DMPC: Preâmbulo) haver definido alguns objetivos: (a) estreitar a colaboração entre as nações; (b) garantir o respeito aos direitos dos demais; e, (c) assegurar o exercício das liberdades fundamentais da pessoa humana.

O reconhecimento e o respeito pela diversidade cultural, certamente, não implica na negação da interação cultural nem na identificação de características comuns presentes à unidade cultural.

Destaco que a UNESCO consagrou a diversidade cultural como patrimônio comum da humanidade, assim sendo, em decorrência desse status, deve ser valorizada e preservada em proveito de todos (CPPDEC: Preâmbulo).

* Juiz. Identidade cultural da Amazônia como direito fundamental é o tema da tese de doutoramento na área de Ciências Jurídico-Políticas registrada pelo Autor na Universidade Clássica de Lisboa.